Integração de Cuidados: «Temos que fazer acontecer… mas já temos muitos projetos no terreno»
Outubro 10, 2023Integração de Cuidados: «Temos que fazer acontecer… mas já temos muitos projetos no terreno»
Adelaide Belo, presidente da The Portuguese Association for Integrated Care (PAFIC), sublinhou, na sessão de abertura do III Encontro de Integração de Cuidados, que a escolha do tema da reunião – “Fazer acontecer e acrescentar valor”, deve ser “a grande mensagem” a transmitir neste momento.
Admitindo que se possa discutir qual o melhor modelo de intervenção para promover a integração de cuidados, Adelaide Belo considera ter chegado o momento de agir. O Encontro da PAFIC, que se realizou dia 23 de setembro, decorreu desta vez na capital, mais precisamente no Grande Auditório João Lobo Antunes, da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
“Já temos muitos projetos no terreno”
Sublinhando que “este dia foi pensado essencialmente para permitir a partilha de experiências”, a especialista de Medicina Interna da Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano deixou claro que, no seu entender, “fazer” é a palavra-chave. “Eu acho que isso é o mais importante!”, frisou.
Adelaide Belo
“Vamos fazer acontecer com o que temos, e já temos muitos projetos no terreno”, afirmou, chamando a atenção para as experiências que iriam ser apresentadas ao longo das jornadas.
Adelaide Belo não concluiria a sua breve intervenção sem lembrar que já há projetos no terreno, usando a imagem das “peças do puzzle” que “ainda estão espalhadas” e que é preciso começar a juntar para se atingir o objetivo de “fazer a figura”.
“Qualidade assistencial e coordenação entre os vários níveis de cuidados são elementos essenciais”
“As pessoas doentes com multimorbilidade são as principais utilizadoras dos nossos serviços de saúde”, contextualizou Carlos Moreira, um dos convidados a participar na sessão de abertura do III Encontro Nacional de Integração de Cuidados, na sua qualidade de diretor do Departamento de Medicina do Centro Hospitalar e Universitário Lisboa Norte (CHULN).
No entanto, sublinhou que “a resposta obtida nem sempre se mostra adequada, principalmente devido ao facto de recorrerem múltiplas vezes à urgência do hospital, ficando muitas vezes internadas”.
Nesses casos, “é necessária uma abordagem contínua, de forma a que as alterações do seu estado de equilíbrio patológico sejam detetadas e imediatamente controladas”, referiu aquele responsável, acrescentando: “Essa abordagem deve ser feita preferencialmente em ambulatório, o que melhora a qualidade de vida da pessoa com doença crónica, bem como a eficácia do seu tratamento”.
Catarina Baptista, Eunice Carrapiço, Adelaide Belo e Carlos Moreira
Carlos Moreira, que é especialista de Medicina Interna, recordou estar demonstrado que se trata de utentes que estabelecem “contactos múltiplos” com o SNS e que é possível reduzir o número de internamentos se forem identificadas precocemente as situações de agudização da doença.
“Reduzir a taxa de reospitalização é um dos objetivos a atingir na gestão da pessoa com multimorbilidade, pois, tal significará melhor prestação de cuidados de saúde e melhor qualidade de vida e implicará uma redução quer nos custos como também, sobretudo, da mortalidade”, afirmou o médico.
“Envolver a própria comunidade na educação sobre a doença e no apoio ao cidadão com patologia crónica é também uma estratégia potencialmente útil na abordagem integrada que é recomendada e que se pretende”, concluiu Carlos Moreira, que, entretanto, já havia deixado expressa uma certeza:
“A qualidade assistencial e a coordenação entre os vários níveis de cuidados são, reconhecidamente, elementos essenciais para garantir que o doente recebe, de forma atempada e efetiva, os melhores cuidados de saúde.”
“Nós precisamos de vós, de quem está no terreno!”
Catarina Baptista, vogal do Conselho de Administração do CHULN, não teve dúvidas em considerar que “o modelo que lidera a integração de cuidados tem provas dadas e existe no terreno”, embora seja “um modelo complexo, como todos nós estamos a experimentar neste momento”.
Referindo-se à criação das novas Unidades Locais de Saúde, disse que “podem proporcionar ganhos a nível da eficiência, da logística, dos materiais, mas não nos enganemos, o grande propósito desta grande transformação é que os cuidados se organizem em torno do doente, alinhando os diferentes stakeholders em objetivos de prevenção da doença, de promoção da saúde e de aquisição de valores para o doente”.
“Não estou iludida, eu sei que a integração não se faz por despacho, nós precisamos de vós, de quem está no terreno!”, exclamou, dirigindo-se aos presentes na sala.
“Investir na capacitação dos utentes não desresponsabiliza os profissionais”
Eunice Carrapiço, diretora executiva do ACES Lisboa Norte, usou da palavra a seguir e foi cautelosa: “Mexer na estrutura é muitas vezes importante e pode sê-lo para que a integração de cuidados possa, de facto, acontecer, mas não garante que um novo modelo organizativo traduza, efetivamente, uma maior integração de cuidados.”
Procurando justificar o que acabara de dizer, a especialista de MGF referiu que essa integração “implica uma mudança de cultura, uma atitude diferente das organizações, na forma como se vê a missão de cada uma e dos próprios profissionais. E, portanto, implica um processo individual de mudança, e todos sabemos como é difícil mudar os utentes e, mais difícil ainda, mudarmo-nos a nós próprios”.
A responsável do ACES Lisboa Norte reconhece que “temos certamente algumas ferramentas que podem ser facilitadoras deste processo”, como a existência de “um verdadeiro processo clínico eletrónico único” e de um plano de cuidados individual, que “envolva cada vez mais os utentes na gestão do seu próprio processo de saúde e de doença”.
“Este investimento na sua capacitação não desresponsabiliza os profissionais, antes aumenta a nossa responsabilidade em lidar com diferentes níveis de autonomia dos doentes”, sublinhou Eunice Carrapiço, para concluir:
“A integração de cuidados também implica uma abordagem global da pessoa no seu contexto”, isto é, “temos que ser proativos na abordagem de outros problemas que muitas vezes não são expressos pelos utentes”.
Comissão Organizadora: Adelaide Belo, Vanessa Nicolau, Mónica Santos, Inês Espírito Santo, Vanessa Ribeiro, Hugo Mendonça, Miguel Moreira, Cátia Gaspar. (Ausentes: Carlos Russo, Joana Seringa e Vera Almeida)